Por John Otis/Correspondente do CPJ nos Andes
Quando oficiais militares venezuelanos detiveram o freelancer americano Cody Weddle em 11 de março, a experiência foi ao mesmo tempo assustadora e bizarra. Weddle disse que os agentes colocaram um capuz na sua cabeça e o pressionaram a revelar fontes com as quais ele nunca havia falado. Eles sugeriram que o repórter era um membro da CIA e seria acusado de traição. Eles levaram máscaras de gás e coletes de proteção de seu apartamento em Caracas. E, como não tinham material de escritório, os agentes usaram uma almofada de carimbo e quebraram uma de suas canetas para obter a tinta para, assim, tirarem as impressões digitais de Weddle.
Weddle, que estava na Venezuela há quatro anos, foi libertado após cerca de 12 horas e depois deportado. O repórter, que fazia matérias para a estação de TV WPLG, do sul da Flórida, e para o jornal britânico The Telegraph, nunca foi informado do motivo de sua prisão. “Houve muita confusão”, disse Weddle em entrevista por telefone ao CPJ em seu estado natal da Virgínia. “Tudo pareceu muito improvisado.”
Os defensores de liberdade de imprensa veem sua prisão como parte de uma tendência preocupante. Em meio ao aprofundamento da crise política e econômica da Venezuela, dizem que o governo autoritário do presidente Nicolás Maduro está prendendo mais jornalistas. Weddle é um dos 39 jornalistas detidos até agora neste ano, segundo o Instituto de Imprensa e Sociedade (IPYS), de Caracas. Isso é mais do que as 22 detenções registradas pelo IPYS durante todo o ano de 2018.
O governo “está tentando intimidar e desmobilizar jornalistas”, disse ao CPJ a analista do IPYS, Mariengracia Chirinos. “Informar na Venezuela tornou-se uma atividade muito mais arriscada”.
Em alguns casos, os jornalistas reportavam sobre assuntos sensíveis.
Weddle, por exemplo, apresentou reportagens sobre o crescente sentimento antigoverno dentro das poderosas forças armadas, numa época em que os EUA e dezenas de outros países reconheciam o líder da oposição Juan Guaidó como o presidente legítimo do país.
Mas outros jornalistas e operadores de câmera foram presos por ações aparentemente inócuas, como filmar gravite contra o governo ou fazer reportagens ao lado do palácio presidencial de Miraflores, em Caracas.
Carlos Correa, diretor do grupo de liberdade de expressão Espacio Público, de Caracas, disse que as detenções geralmente duram menos de um dia. Dessa forma, disse ele, o governo pode intimidar os jornalistas sem sofrer a reação que pode resultar de mantê-los atrás das grades por períodos mais longos.
Além disso, em meio ao pior colapso econômico da história na Venezuela, Correa disse que os repórteres e operadores de câmeras estão relatando que os agentes de segurança que os detêm estão cada vez mais fugindo com equipamentos caros.
“Prender jornalistas acarreta relativamente poucos custos para o governo, enquanto aqueles que realizam as detenções se beneficiam roubando seus equipamentos”, disse Correa ao CPJ.
Devido aos extensos apagões em toda a Venezuela, o CPJ não pôde entrar em contato com o Ministério das Comunicações para que comentasse.
Entre os detidos desde o início do ano, estavam 22 correspondentes internacionais. Ninguém parece estar imune.
Em 25 de fevereiro, por exemplo, o âncora da Univision, Jorge Ramos, foi brevemente mantido junto com sua equipe no palácio de Miraflores. Sua detenção veio depois que Maduro saiu de uma entrevista contenciosa durante a qual Ramos perguntou se ele deveria chamar Maduro de “presidente” ou “ditador”.
Ramos, a quem o CPJ homenageou com o Prêmio em Memória de Burton Benjamin em 2014, foi brevemente mantido em uma sala escura e revistado. As quatro câmeras e os cartões de memória da equipe foram confiscados e não devolvidos. Logo depois, toda a equipe da Univision foi expulsa da Venezuela.
“Nós experimentamos apenas uma amostra do assédio e abuso que os jornalistas venezuelanos sofrem há anos”, escreveu Ramos no New York Times.
Luis Carlos Díaz, jornalista de rádio e ativista digital venezuelano, recebeu um tratamento muito mais duro. Ele foi pego por agentes de inteligência em 11 de março enquanto ia de bicicleta do trabalho, na estação de rádio Unión, em Caracas, para casa. Sua prisão aconteceu três dias depois de Diosdado Cabello, um político pró-Maduro, exibir um videoclipe de Díaz em seu programa de TV. Cabello acusou o jornalista de conspirar para sabotar o sistema elétrico durante um período de apagões em todo o país.
Chirinos, do IPYS, disse que Díaz foi maltratado em custódia e que os agentes o atingiram na cabeça com seu capacete de bicicleta. Eles ameaçaram prender sua esposa e implicar o casal em um homicídio, alegando que havia um corpo em seu apartamento. Quando os agentes revistaram o apartamento, roubaram vários dispositivos eletrônicos e dinheiro.
Em meio a protestos internacionais, incluindo comentários da Alta Comissária da ONU para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, Díaz foi libertado após cerca de 24 horas. Ele foi acusado de “incitar crime” em conexão com os apagões de eletricidade. Ele deve informar seu paradeiro às autoridades a cada oito dias, permanecer na Venezuela e abster-se de falar à mídia sobre como foi tratado durante a detenção.
Tanto Chirinos quanto Correa previram que, conforme as condições piorassem em meio às sanções econômicas dos EUA, o regime de Maduro poderia intensificar sua campanha contra a imprensa.
Para evitar problemas, disse Chirinos, os jornalistas devem trabalhar na presença de colegas que possam ajudar a espalhar a notícia caso sejam detidos. Ela disse que os repórteres devem ter um cuidado especial ao trabalhar em matérias sobre assuntos delicados e que os correspondentes internacionais podem reduzir seus riscos publicando seu trabalho depois de deixar o país.
“Nenhuma reportagem vale a pena ser preso ou morto”, disse ela.
[Informando de Bogotá]
• A Equipe de Resposta a Emergências do CPJ tem recomendações de segurança para jornalistas que trabalham na Venezuela, além de outras orientações e recursos de segurança.