Na noite de 8 de dezembro de 2020, a Polícia Militar do Rio de Janeiro publicou um vídeo em seu site e em suas contas oficiais no YouTube e Twitter em resposta a uma reportagem que Rafael Soares, repórter que cobre segurança pública para os jornais O Globo e Extra, publicou mais cedo naquele dia.
O artigo de Soares dizia respeito a uma unidade da Polícia Militar sob investigação por seu suposto envolvimento no assassinato de duas crianças na cidade de Duque de Caxias, no estado do Rio de Janeiro, e o aumento do uso de munições por essa unidade.
No vídeo, a tenente-coronel Gabryela Dantas, porta-voz da Secretaria de Estado de Polícia Militar do Rio de Janeiro, refere-se ao texto de Soares como uma “ilação totalmente irresponsável, além de completamente mentirosa, é covarde e inescrupulosa”.
Dantas disse que Soares estava “aproveitando de uma comoção nacional para colocar a população contra a polícia militar”, e pediu que os que a assistiam compartilhassem o vídeo.
O tuíte da polícia sobre o vídeo foi retirado do ar desde que o CPJ o avaliou em 9 de dezembro, e o CPJ conseguiu acessar o vídeo no site da Polícia Militar de um computador no Brasil, mas não conseguiu carregar a página dos Estados Unidos. O vídeo do YouTube permanecia online no momento da publicação.
Quando foi postado, o tuíte descreveu o vídeo como o “posicionamento oficial da Secretaria de Estado de Polícia Militar sobre matéria mentirosa publicada em jornais do grupo Globo pelo jornalista Rafael Soares”.
Fabiana Poubel e Daniel Silveira, membros do Partido Social Liberal de direita na Câmara dos Deputados e oficiais licenciados da Polícia Militar no Rio de Janeiro, tuitaram sobre o vídeo com comentários críticos adicionais sobre Soares.
A Editora Globo, que publica O Globo e Extra, divulgou nota condenando o vídeo e dizendo que “não é papel de uma instituição de Estado atacar pessoalmente um profissional [de mídia] nem incitar a população contra ele”.
Em um tuíte, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) disse que o vídeo demonstrou um “claro objetivo de intimidar o repórter” e pediu uma resposta do governador do estado do Rio de Janeiro.
Um representante da assessoria de imprensa da Polícia Militar do Rio de Janeiro respondeu ao pedido de comentários do CPJ enviado por e-mail com uma declaração dizendo que a corporação “repudia veementemente a reportagem falaciosa do Jornal Extra, desenvolvida pelo jornalista Rafael Soares” e qualificou a reportagem como “incompatível com a verdade e tendenciosa. ”
O representante alegou que Soares “decidiu publicar inverdades, comprometendo a reputação da Polícia Militar, bem como a dos policiais militares lotados no Batalhão citado na reportagem”.
Em 9 de dezembro, o governador interino do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, ordenou que Dantas fosse destituída de seu cargo de porta-voz da Polícia Militar, de acordo com as informações da imprensa.
Em um e-mail ao CPJ na noite de 9 de dezembro, a porta-voz do governo do estado do Rio de Janeiro, Carolina Perez, encaminhou ao CPJ um tuíte do governador interino Castro e uma declaração no site da Polícia Militar do Rio de Janeiro.
Em seu tuíte, Castro disse: “Defendo o diálogo com a imprensa. O debate de ideias é importante, mas é preciso preservar e respeitar ambos os lados”.
Em seu comunicado, a Polícia Militar disse que está “constantemente sob avaliação crítica de setores da sociedade, como a imprensa”. A polícia acrescentou que “ao personalizar esse descontentamento em um repórter, [a Polícia Militar] ultrapassou um limite que feriu o equilíbrio de sua atuação. Reconhecemos o valor da liberdade de imprensa”.