São Paulo, 13 de novembro, 2015- O Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) pede às autoridades do Brasil para investigar completamente um ataque à casa de um jornalista local, no estado do Paraná. João Muniz disse ao CPJ que sua casa foi baleada na quinta-feira e que ele acredita que suas reportagens sobre disputas de terra foi o motivo para o ataque
“Nós condenamos o uso da violência para intimidar João Muniz e instamos as autoridades brasileiras a investigar o ataque e garantir a segurança de Muniz e sua família”, disse em Nova York Carlos Lauría, coordenador sênior do programa do CPJ para as Américas. “A liberdade de imprensa está ameaçada no Brasil com jornalistas locais enfrentando cada vez mais a intimidação, assédio e assassinato.”
Agressores em um carro dispararam cerca de 10 cartuchos de munição na casa do jornalista a 1h20, de acordo com um comunicado enviado à CPJ do jornal Correio do Povo do Paraná, o periódico para o qual Muniz escreve. Muniz estava no andar de cima com sua esposa e filho de 10 anos de idade no momento do ataque, mas ninguém ficou ferido, acrescentou o comunicado.
“É muito difícil passar por tudo isso sabendo que estamos apenas tentando fazer o nosso trabalho”, disse Muniz no comunicado enviado à CPJ. “Mas estou confiante de que a polícia vai esclarecer isso e descobrir os autores intelectuais do que poderia ter sido um massacre.”
Muniz vive em Quedas do Iguaçu, a cerca de 40 milhas de Laranjeiras do Sul, uma cidade no sul do estado do Paraná. A região é o palco de conflitos de terra envolvendo membros do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, um dos maiores movimentos de reforma agrária do Brasil, cujas táticas incluem a ocupação de terras que eles dizem ser improdutiva.
Dois lotes de terreno de propriedade da empresa madeireira Araupel perto Quedas do Iguaçu foram ocupados por membros do grupo. A empresa ganhou uma batalha judicial para removê-los, mas o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra se recusou a sair, disse ao CPJ Muniz, que contou que cobre o conflito há mais de um ano.
Muniz disse que ele é membro de uma comissão formada por moradores, representantes do governo do estado, e da aplicação da lei que está pressionando as autoridades para fazer cumprir a ordem judicial e remover à força os membros do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra da terra. “Como jornalista em uma comissão você é visível”, Muniz disse ao CPJ. “Eles me veem como defensor dos interesses da empresa.”
A Araupel é um anunciante regular no Correio do Povo do Paraná, Muniz acrescentou.
Os indivíduos filiados ao Movimento dos Trabalhadores Sem Terra ameaçaram verbalmente Muniz e outros repórteres pela sua cobertura; as paredes do edifício do jornal foram vandalizadas e “objetos estranhos, como foices” foram deixadas na sua porta, de acordo com Muniz e a declaração divulgada pelo jornal. Muniz disse que estes atos foram relatados à polícia.
Muniz disse ao CPJ que ele está enfrentando atualmente um caso de difamação civil interposto por membros do grupo contra ele por suas reportagens. A audiência teve lugar esta semana, disse ele. Muniz e Suelem Camilo, chefe de redação do jornal, disseram que pessoas, que Muniz não quis identificar pelo nome, tinham chegado aos escritórios do jornal e ameaçaram o repórter nos últimos meses.
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra não respondeu ao pedido do CPJ para comentar o assunto.
Pedro Fernandes de Oliveira, o chefe de polícia que está investigando o tiroteio, disse ao CPJ que “não tem dúvidas” de que alguém do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra ou alguém ligado ao grupo foi o responsável. Ele disse que a polícia estava fazendo testes balísticos em todas as balas recuperadas da casa do repórter.
“Alguns indivíduos, e deixe-me ser claro, nem todas as pessoas e não os líderes, estão irritados com algumas das coisas que Muniz tinha escrito e houve ameaças, tanto diretas quanto indiretas”, acrescentou. “Esta foi muito direta.”
Milhares de trabalhadores sem terra foram mortos em confrontos com a polícia e proprietários de terras nas últimas décadas e, em alguns casos, eles retaliaram com violência e ameaças, de acordo com reportagens.
Uma declaração da União dos Proprietários de Jornais e Revistas do Paraná, publicado pela Gazeta do Povo na sua reportagem sobre o ataque, descreveu o tiroteio como “uma clara tentativa de intimidar e deter o trabalho da imprensa”.
Pelo menos quatro jornalistas foram assassinados no Brasil este ano em retaliação direta por seu trabalho, segundo pesquisa do CPJ.