BRASIL
Embora a liberdade de expressão esteja sacramentada na Constituição brasileira de 1988, a capacidade dos jornalistas de cobrirem as notícias foi limitada por juizes cujas interpretações legais restringiram efetivamente a imprensa. Durante a disputa para a eleição geral de 1º de outubro, tribunais eleitorais proibiram meios de comunicação de cobrirem alegações de corrupção contra políticos candidatos.
Muitos jornalistas também trabalharam em condições perigosas. Mesmo repórteres que trabalham em grandes centros políticos e econômicos, como Brasília, São Paulo, e Rio de Janeiro, correm riscos sempre que informam sobre crime organizado, tráfico de drogas e corrupção política. Em 12 de agosto, o repórter da TV Globo Guilherme de Azevedo Portanova e o técnico Alexandre Coelho Calado foram seqüestrados em São Paulo por membros do grupo criminoso Primeiro Comando da Capital (PCC). Calado foi libertado mais tarde, no mesmo dia, com uma gravação em vídeo pleiteando melhorias nas condições de prisão. Os raptores alertaram que Portanova, que havia coberto uma onda de ataques do PCC em maio, seria morto se a TV Globo não retransmitisse a mensagem. Depois de consultar agências internacionais de segurança, a TV Globo veiculou o vídeo de três minutos em 13 de agosto, e Portanova foi libertado ileso no dia seguinte.
No interior do Nordeste e na região fronteiriça com o Paraguai, jornalismo e política geralmente se entrelaçam, em uma situação volátil que expõem jornalistas a ameaças, ataques, e assassinatos. Nas áreas rurais, onde o rádio é a fonte primária de notícias, radialistas geralmente fazem campanha para candidatos, atacam adversários políticos, e usam o veículo como trampolim para suas próprias aspirações políticas. Em 2006, as eleições gerais novamente viram jornalistas e radialistas concorrendo e ganhando cargos eletivos.
Francos e altamente partidários, estes profissionais também têm se tornado alvos da violência. Cinco radialistas foram mortos durante os últimos cinco anos na região, fazendo do Nordeste brasileiro uma das áreas mais fatais para jornalistas nas Américas. Os assassinatos incitaram o CPJ a enviar uma missão aos estados do Ceará e Pernambuco em agosto.
Em “No ar: política, paixão e notícia”, um Informe Especial divulgado em outubro, o CPJ documentou o freqüente abuso da legislação de 1998 que pretendia diversificar o conteúdo das transmissões concedendo licenças de radiodifusão para associações e fundações comunitárias. Em vez disso, o CPJ e outros pesquisadores apuraram que políticos se tornaram proprietários ou controladores de centenas dessas emissoras comunitárias. Quase nove de cada 10 pedidos de licença para rádios comunitárias apresentados ao Congresso para aprovação em 2002, por exemplo, não eram de legítimas organizações sem fins lucrativos disse Israel Bayma, pesquisador da Universidade de Brasília (UnB), cujo trabalho tem sido citado nacionalmente. Apesar da regulamentação proibir explicitamente propaganda política, estas estações funcionam como porta-vozes de políticos em quase todos os níveis de governo.
O abuso da lei de radiodifusão comunitária sobrecarregou o sistema regulador e retardou a aprovação de pedidos de licença legítimos. Organizações comunitárias reclamam que a ANATEL, agência reguladora de telecomunicações, fechou dezenas de rádios comunitárias que operavam sem licença e confiscaram seus equipamentos. Centenas de rádios comunitárias em operação solicitaram formalmente a licença, mas o processo de aprovação leva vários anos. Funcionários do governo culpam a dificuldade em identificar as estações comunitárias legítimas, das controladas por políticos e empresários, pela demora.
Políticos também possuem várias emissoras de rádio comercial, concessões que são leiloadas pelo governo federal. O Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo (PROJOR), uma organização de liberdade de expressão e ética na mídia, informou que 51 dos 513 deputados federais, em 2005, eram sócios ou diretores de emissoras de rádio ou TV em todo o país. O PROJOR moveu uma representação ao Procurador Geral em outubro de 2005, alegando que a posse de meios de comunicação por políticos viola o artigo 54 da Constituição, que diz que os legisladores federais não podem firmar ou manter contrato com “empresa concessionária de serviço público”. A análise preliminar da Procuradoria Geral da União não encontrou nenhuma atividade ilegal.
O controle político deu origem a uma linha gritante de comentários partidários e ataques orientados. “Quase todas as rádios pertencem a grupos políticos e eles se confrontam através das emissoras” disse Aquiles Lopes, repórter do jornal Diário de Pernambuco, com sede em Recife. Esse confronto, por sua vez, gera ameaças e ataques contra jornalistas, informou ele.
A lei eleitoral brasileira regula estritamente a distribuição de propaganda política nos meios de comunicação impressos e áudios-visuais durante a corrida eleitoral. Jornais podem publicar uma opinião favorável a um candidato, partido político, ou coalizão, desde que o artigo não seja pago pela campanha política. Rádios e televisões, contudo, são proibidas de “transmitir propaganda política ou disseminar opiniões favoráveis ou contrárias a um candidato, partido político ou coalizão” nos três meses anteriores à eleição. O Tribunal Regional Eleitoral é encarregado de julgar as reclamações.
As ações judiciais eleitorais, assim como outras relacionadas à honra e reputação de candidatos à eleição, são exaustivamente utilizadas por políticos que argumentam que qualquer crítica ou alegação de corrupção é planejada para favorecer seus rivais. Freqüentemente, eles têm sucesso em suas demandas. Em 30 de setembro, por exemplo, um juiz eleitoral do Amazonas fechou o canal de TV A Crítica, sediado em Manaus, por 24 horas em resposta a uma queixa apresentada pelo governador Eduardo Braga. Em 27 de setembro, durante um debate ao qual Braga não compareceu, a TV A Crítica veiculou segmentos com reportagens sobre suposta corrupção na administração estadual. O juiz considerou que as reportagens foram propaganda eleitoral ofensiva à honra e à dignidade de Braga.
Também, severas medidas que restringem o trabalho da imprensa permanecem nos livros. O Código Penal e a infame Lei de Imprensa, de 1967 – aprovada sob o regime militar – criminalizam a calúnia e a difamação. A Lei de Imprensa prevê penas de seis meses a três anos de prisão por calúnia, enquanto o código penal estipula pena de três meses a um ano por difamação. Ações judiciais por difamação contra a mídia – a maioria, queixas civis – cresceram centenas de vezes nos últimos anos, de acordo com informes locais. Empresários, políticos e funcionários públicos freqüentemente apresentam múltiplas ações judiciais contra meios de comunicação e jornalistas, em um esforço para pressioná-los financeiramente e forçá-los a interromper suas críticas. O queixoso pede somas desproporcionalmente grandes em dinheiro por “danos moras e materiais”.
Em nome da proteção da privacidade e da reputação, juizes rotineiramente expedem mandatos proibindo meios de comunicação de cobrirem alegações de corrupção envolvendo funcionários públicos, políticos e empresários. Em 8 de maio, por exemplo, um juiz de Campo Grande, capital do estado de Mato Grosso do Sul, concedeu ao candidato governista André Puccinelli uma injunção contra o diário local Correio do Estado. Puccinelli buscava constranger o jornal por fazer uma matéria sobre uma investigação federal sobre lavagem de dinheiro, primeiramente divulgada na edição de 25 de abril do jornal paulista O Estado de S.Paulo. Partindo da reportagem, o Correio do Estado buscou o comentário de Puccinelli, que negou qualquer delito. O juiz concedeu o pedido de Puccinelli e sentenciou o Correio do Estado a satisfazer as exigências de “objetividade da informação”, “verificação de fontes” e “imparcialidade e independência nas notícias publicadas” em sua cobertura sobre Puccinelli. Caso contrário, seria multado em R$ 500,00 por cópia publicada de qualquer história que falhasse em cumprir todos os critérios. O jornal apelou da decisão.
A concentração da propriedade de mídia continua sendo uma preocupação, especialmente no setor de telecomunicações, dominado pelo grupo Organizações Globo, um das maiores empresas de mídia do mundo e perene líder nacional em receita publicitária. Em alguns dos maiores mercados internos, um grupo dominante controla jornais, redes de televisão aberta e a cabo, estações de rádio e portais de Internet, limitando a diversidade de informação oferecida aos brasileiros.